CC 165.221/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 03/03/2021
DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Ação civil pública. Afastamento da cobrança de multa por resolução do contrato por motivo de força maior ou caso fortuito, especialmente roubo e furto do telefone celular. Relação jurídica litigiosa. Direito do consumidor. Competência das Turmas da 2ª Seção.
Compete às Turmas da Segunda Seção julgar recurso especial interposto em face de concessionárias do serviço de telefonia com o objetivo de afastar a cobrança de multa em caso de resolução do contrato por motivo de roubo ou furto do aparelho celular.
Cinge-se a controvérsia à definição da Turma competente para processar e julgar recurso especial decorrente de ação civil pública proposta pelo Ministério Público estadual em face de concessionárias do serviço de telefonia celular com o objetivo de afastar a cobrança de multa em caso de resolução do contrato por motivo de força maior ou caso fortuito, especialmente nas hipóteses de roubo e furto do telefone celular.
A Corte Especial possui entendimento de que compete à Primeira Seção processar e julgar feito em que se discute a adequação do serviço público concedido (v. g. CC 138.405/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe de 10/10/2016).
Ocorre que tal entendimento não se aplica nos casos em que a discussão dos autos esteja restrita ao exame da abusividade ou não de cláusula contratual que rege relação de natureza puramente consumerista travada entre clientes e concessionárias do serviço de telefonia celular.
Assim, levando-se em conta a natureza dessa relação jurídica litigiosa, compete às Turmas que integram a Segunda Seção processar e julgar a presente questão
APn 912/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 03/03/2021.
DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL
Queixa-crime. Calúnia contra pessoa morta. Retratação cabal antes da sentença. Ato unilateral. Extinção da punibilidade. Artigos 143 e 107, VI, do Código Penal.
A retratação da calúnia, feita antes da sentença, acarreta a extinção da punibilidade do agente independente de aceitação do ofendido.
Consoante as diretrizes do Código Penal: "Art. 143. O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena. Parágrafo único. Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa".
A retratação, admitida nos crimes de calúnia e difamação, não é ato bilateral, ou seja, não pressupõe aceitação da parte ofendida para surtir seus efeitos na seara penal, porque a lei não exige isso. O Código, quando quis condicionar o ato extintivo da punibilidade à aceitação da outra parte, o fez de forma expressa, como no caso do perdão ofertado pelo querelante depois de instaurada a ação privada.
Como é sabido, não há como se fazer analogia in malam partem, contra o réu, para lhe impor condição para causa extintiva da punibilidade que a Lei Penal não exigiu.
Na verdade, basta que a retratação seja cabal. Vale dizer: deve ser clara, completa, definitiva e irrestrita, sem remanescer nenhuma dúvida ou ambiguidade quanto ao seu alcance, que é justamente o de desdizer as palavras ofensivas à honra, retratando-se o ofensor do malfeito.
Ademais, em se tratando de ofensa irrogada por meios de comunicação - como no caso, que foi por postagem em rede social na internet -, o parágrafo único do art. 143 do Código Penal dispõe que "a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa".
A norma penal, ao abrir ao ofendido a possibilidade de exigir que a retratação seja feita pelo mesmo meio em que se praticou a ofensa, não transmudou a natureza do ato, que é essencialmente unilateral. Apenas permitiu que o ofendido exerça uma faculdade.
Portanto, se o ofensor, desde logo, mesmo sem consultar o ofendido, já se utiliza do mesmo veículo de comunicação para apresentar a retratação, não se afigura razoável desmerecê-la, porque o ato já atingiu sua finalidade legal.
HDE 1.809/US, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, julgado em 03.03.2021, com pedido de vista.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Homologação de sentença estrangeira. Fixação de honorários advocatícios. Art. 85, § 8º do CPC. Valor discutidos na sentença a ser homologada. Pedido de Vista.
A Corte Especial, por unanimidade, deferiu o pedido de homologação de sentença estrangeira, nos termos do voto do Ministro Relator. Quanto aos honorários advocatícios, o Ministro Relator fixou o valor em R$ 40.000,00, defendendo que deve ser aplicado ao caso o Art. 85, § 8º do CPC, que prevê a utilização de apreciação equitativa e, nesse ponto, deve ser utilizado como um dos critérios para o estabelecimento do montante o proveito econômico discutido na sentença a ser homologada, frisando que esse valor, porém, não deve ser utilizado como simples base de cálculo para a verba honorária. Nesse ponto, o Ministro Relator foi acompanhado pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Divergiram a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, acompanhada pelos Srs. Ministros Francisco Falcão e Herman Benjamin, fixando o valor em R$ 5.000,00, defendendo que deve ser aplicado ao caso o Art. 85, § 8º do CPC, mas que os valores discutidos na sentença a ser homologada não devem ser levados em conta na fixação da verba honorária, considerando que o STJ se limita a analisar aspectos formais nessa espécie de processo. Por fim, pediu vista a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
REsp 1.429.799/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021.
DIREITO ADMINISTRATIVO
Aquisição de veículos usados para posterior revenda. Transferência de propriedade para a revendedora. Expedição de novo certificado de registro de veículos. Art. 123, I, do Código de Trânsito Brasileiro. Obrigatoriedade.
A transferência de propriedade de veículo automotor usado implica, obrigatoriamente, a expedição de novo Certificado de Registro de Veículo - CRV, ainda quando a aquisição ocorra para fins de posterior revenda.
Da leitura do art. 123, I, do Código de Trânsito Brasileiro, depreende-se que a transferência de titularidade do veículo, por si só, acarreta na necessária e obrigatória expedição de novo Certificado de Registro do Veículo - CRV.
No caso, o impetrante sustentou que o referido art. 123, I, não poderia ensejar dois tratamentos distintos, a saber: montadoras e concessionárias de veículos novos, mesmo sendo, em tese, proprietárias de tais bens, estariam dispensadas de seu registro junto ao DETRAN, ao passo que, na revenda de veículos usados, as empresas desse ramo de negócios, ao adquirí-los, mesmo por período transitório, teriam de se submeter à exigência de um novo CRV.
Entretanto, trata-se a discussão sobre apenas aquelas situações que envolvam a expedição de novo CRV de veículos usados, que tenham sido adquiridos para revenda e que, presume-se, já possuíam CRV em nome do anterior proprietário (alienante).
Em relação a essa específica modalidade negocial (revenda de veículos usados), não há negar, o art. 123, I, do CTB impõe a expedição de novo CRV, em vista da desenganada transferência da propriedade do veículo.
REsp 1.506.932/PR, Rel. Min. Auro Campbell Marques, 2 Turma, por unanimidade, julgado em 02.03.2021.
DIREITO ADMINISTRATIVO
Aposentadoria. Ato complexo. Confirmação pelo Tribunal de Contas. Decadência. Readequação de entendimento. RE 636.553/RS, Tema 445/STF. Prazo de cinco anos. Marco inicial. Chegada do processo na corte de contas. Juízo de retratação.
Os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas
A controvérsia dos autos cinge-se à saber se é possível aplicação de prazo decadencial para que a Corte de Contas da União analise aposentadoria de servidor público, ato necessário à perfectibilização da concessão do benefício previdenciário.
Em decisão anteriormente proferida, esta Turma consignou, considerando a jurisprudência firme desta Casa, no sentido de que, por se tratar de ato complexo, a aposentadoria de servidor público só se completa com a análise pelo TCU e, portanto, não corre prazo decadencial entre a concessão pelo órgão e a decisão final proferida pelo TCU.
No entanto, o STF, em julgamento realizado sob a sistemática da repercussão geral, pacificou o entendimento de que, em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas (Tema 445, RE 636.553/RS).
REsp 1.872.102/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021.
DIREITO CIVIL
Contrato de gerenciamento de carreira. Atleta profissional menor de dezoito anos. Aplicação da Lei n. 9.615/1998 (Lei Pelé). Descabimento. Emancipação legal. Relação empregatícia. Art. 5º, parágrafo único, V, do CC. Autorização judicial. Art. 1.691 do CC. Desnecessidade.
A autorização judicial não é pressuposto de validade de contratos de gestão de carreira e de agenciamento de atleta profissional celebrados por atleta relativamente incapaz devidamente assistido pelos pais ou responsável legal.
A emancipação legal proveniente de relação empregatícia, prevista no art. 5º, parágrafo único, V, parte final, do CC/2002, pressupõe: I) que o menor possua ao menos dezesseis anos completos; II) a existência de vínculo empregatício; e III) que desse liame lhe sobrevenha economia própria.
Por decorrer diretamente do texto da lei, essa espécie de emancipação prescinde de autorização judicial, bem como dispensa o registro público respectivo para a validade dos atos civis praticados pelo emancipado, bastando apenas que se evidenciem os requisitos legais para a implementação da capacidade civil plena.
O regramento disposto no art. 1.691 do CC, que exige autorização judicial para a contração de obrigações em nome do filho menor, não se aplica ao filho emancipado, porquanto dotado este de capacidade civil plena, podendo realizar os atos da vida civil, por si só.
Se o filho menor for emancipado, seja qual for a espécie de emancipação, a administração do seu patrimônio é retirada dos seus pais e entregue ao próprio infante, segundo o disposto no art. 1.690, caput, parte final, do CC: compete aos pais, e na falta de um deles ao outro, com exclusividade, representar os filhos menores de dezesseis anos, bem como assisti-los até completarem a maioridade ou serem emancipados.
Além disso, convém pontuar que a emancipação constitui hipótese de extinção do poder familiar, nos termos do art. 1.635, II, do CC.
Por derradeiro, enfatiza-se que a simples ocorrência de emancipação legal não tem o condão de afastar a aplicação de regramentos dispostos em leis especiais, ante o critério da especialidade utilizado a fim de dirimir o conflito aparente de normas, a exemplo do que se extrai do Enunciado n. 530 do CJF, aprovado na VI Jornada de Direito Civil: a emancipação, por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Com base nessa cognição, poder-se-ia cogitar do exame da validade dos contratos de gestão de carreira e de agenciamento de jogador profissional de futebol à luz do disposto no art. 27-C, VI, da Lei n. 9.615/1998 (Lei Pelé).
No caso, celebrados os contratos antes da entrada em vigor do inciso VI do art. 27-C da Lei n. 9.615/1998 (Lei Pelé), ou seja, após pactuados os contratos tidos como nulos, não se lhes aplicando, desse modo, retroativamente, por se tratar de ato jurídico perfeito (art. 6º, caput e § 1º, da LINDB).
Outrossim, a título de reforço argumentativo, ainda que fosse o caso de análise da higidez dos contratos através da perspectiva do art. 27-C, VI, da Lei n. 9.615/1998, depreende-se da literalidade da norma que a vedação à celebração de contrato de gerenciamento de carreira só se aplica ao atleta em formação menor de 18 (dezoito) anos.
REsp 1.873.918-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021, DJe 04/03/2021
DIREITO CIVIL
Direito ao nome. Substituição de patronímico familiar pelo do cônjuge. Retomada do nome de solteiro ainda na constância do vínculo conjugal. Possibilidade.
É admissível o retorno ao nome de solteiro do cônjuge ainda na constância do vínculo conjugal.
O direito ao nome é um dos elementos estruturantes dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, pois diz respeito à própria identidade pessoal do indivíduo, não apenas em relação a si, como também em ambiente familiar e perante a sociedade.
Conquanto a modificação do nome civil seja qualificada como excepcional e as hipóteses em que se admite a alteração sejam restritivas, esta Corte tem reiteradamente flexibilizado essas regras, interpretando-as de modo histórico-evolutivo para que se amoldem a atual realidade social em que o tema se encontra mais no âmbito da autonomia privada, permitindo-se a modificação se não houver risco à segurança jurídica e a terceiros.
No caso, a parte, que havia substituído um de seus patronímicos pelo de seu cônjuge por ocasião do matrimônio, fundamentou a sua pretensão de retomada do nome de solteira, ainda na constância do vínculo conjugal, em virtude do sobrenome adotado ter se tornado o protagonista de seu nome civil em detrimento do sobrenome familiar, o que lhe causa dificuldades de adaptação, bem como no fato de a modificação ter lhe causado problemas psicológicos e emocionais, pois sempre foi socialmente conhecida pelo sobrenome do pai e porque os únicos familiares que ainda carregam o patronímico familiar se encontram em grave situação de saúde.
Dado que as justificativas apresentadas não são frívolas, mas, ao revés, demonstram a irresignação de quem vê no horizonte a iminente perda dos seus entes próximos sem que lhe sobre uma das mais palpáveis e significativas recordações - o sobrenome -, deve ser preservada a intimidade, a autonomia da vontade, a vida privada, os valores e as crenças das pessoas, bem como a manutenção e perpetuação da herança familiar.
REsp 1.511.978-BA, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021
DIREITO CIVIL
Denúncia vazia. Art. 47, V, da Lei n. 8.245/1991. Termo inicial. Formação do vínculo contratual.
O termo inicial de contagem do prazo para a denúncia vazia, nas hipóteses de que trata o art. 47, V, da Lei n. 8.245/1991, coincide com a formação do vínculo contratual.
A controvérsia reside na interpretação do art. 47, V, da Lei n. 8.245/1991, que tem a seguinte redação: Art. 47. Quando ajustada verbalmente ou por escrito e como prazo inferior a trinta meses, findo o prazo estabelecido, a locação prorroga - se automaticamente, por prazo indeterminado, somente podendo ser retomado o imóvel: (...) V - se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos. (...).
Defende-se que a contagem do período indicado no dispositivo somente se inicia com o fim da locação pelo prazo estabelecido contratualmente, quando passa a viger por tempo indeterminado.
Note-se, contudo, que, segundo o comando expresso do dispositivo, o requisito temporal refere-se à "vigência ininterrupta da locação", vínculo cujo prazo deve ser contado desde a sua formação inicial, não sofrendo interrupção pelo fato de haver sido prorrogada por prazo indeterminado após o decurso do lapso temporal originariamente avençado.
É dizer: a locação por prazo indeterminado não traduz uma nova contratação, senão o mero prolongamento da avença originária, vigendo ininterruptamente desde que a posse direta do imóvel é transmitida ao locatário, em regra com a simbólica entrega das chaves.
REsp 1.653.405-RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Multa do art. 249 do ECA. Caráter preventivo, punitivo e pedagógico. Maioridade da vítima. Afastamento. Inocorrência.
A multa instituída pelo art. 249 do ECA não possui caráter meramente preventivo, mas também punitivo e pedagógico, de modo que não pode ser afastada sob fundamentação exclusiva do advento da maioridade civil da vítima dos fatos que determinaram a imposição da penalidade.
O Tribunal de origem afastou a aplicação da penalidade prevista no art. 249 do ECA unicamente em decorrência do advento da maioridade civil da apontada vítima.
Contudo, o simples advento da maioridade não pode ser fundamento para o afastamento da multa do art. 249 do ECA, sob pena de esvaziamento do instituto e enfraquecimento da rede protetora estabelecida pelo diploma legal.
Precedentes desta Corte Superior reconhecem não somente o caráter punitivo da referida multa, mas também os igualmente importantes aspectos pedagógicos e preventivos, a fim de se evitar a perpetração de condutas de tal natureza.
Conclui-se que a maioridade civil não tem o condão de retroagir para afastar os efeitos da aplicação do ECA.
REsp 1.707.014/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Ação de prestação de contas. Interesse de agir do inventariante. Natureza dúplice da demanda. CPC/2015.
Na vigência do CPC/2015, remanesce o interesse de agir do inventariante na ação de prestação de contas, mantido o caráter dúplice da demanda.
A ação de prestação de contas tem por escopo aclarar o resultado da administração de negócios alheios (apuração da existência de saldo credor ou devedor) e, sob a regência do CPC de 1973, ostentava caráter dúplice quanto à sua propositura, podendo ser deduzida tanto por quem tivesse o dever de prestar contas quanto pelo titular do direito de exigi-las.
Nesse contexto, o dever de prestar contas incumbia àquele que administrava bens ou interesses alheios, ao passo que o direito de as exigir cabia àquele em favor do qual os negócios haviam sido geridos. A apuração de saldo credor, em favor de uma das partes, implicava a prolação de sentença condenatória em detrimento do devedor.
Nessa ordem de ideias, pelo novel diploma, a legitimidade ativa para propor a presente ação é apenas daquele que tem seus bens, valores ou interesses administrados por outrem, isto é, por aquele que detém a pretensão de exigir contas (CPC, art. 550). Como se percebe, o referido procedimento especial é voltado tão somente para a ação de exigir contas, ficando a pretensão de dar contas relegada ao procedimento comum.
No entanto, não se pode olvidar que a pretensão de dar contas sempre teve um procedimento mais simples, já que o autor, de plano, reconhecia o seu dever de prestar as contas, limitando-se o seu mérito a desincumbir de tal mister, recebendo a quitação ou vendo declarado eventual saldo credor/devedor em relação a ele.
Importante destacar, ademais, que embora o dever de dar contas seja único e idêntico, o regime jurídico processual da prestação de contas é diverso, a depender se a administração é legal ou contratual, notadamente em razão dos ditames do novo art. 550 do CPC, voltado às obrigações derivadas de um dever negocial de prestá-las (advogado, depositário, administrador de empresa, síndico, dentre outras), e da contrapartida ao art. 553, destinado processualmente às obrigações determinadas pela lei (inventariante, administrador da falência, tutor, curador, dentre outros).
Ademais, assim como consagrado jurisprudencialmente sob a égide do CPC de 1973, o Codex de 2015 explicitou o dever do autor de, na petição inicial, especificar, detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com documentos comprobatórios dessa necessidade, se existirem.
São as causas de pedir remota e próxima, as quais devem ser deduzidas, obrigatoriamente, na exordial, a fim de demonstrar a existência de interesse de agir do autor.
Deveras, o inventariante é o administrador e o representante legal do espólio, incumbindo a ele prestar as primeiras e últimas declarações, exibir em cartório os documentos relativos ao espólio, juntar aos autos certidões e documentos, trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, renunciante ou excluído e requerer a declaração de insolvência (CPC, art. 618). Ainda, ouvidos os interessados e com autorização do juiz, alienar bens, transigir, pagar dívidas e fazer despesas necessárias para conservação e melhoramento dos bens do espólio (CPC, art. 619).
Dentre os deveres do inventariante está - e aqui é importante o destaque -, o dever de "prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ou sempre que o juiz lhe determinar" (CPC, art. 618, VII; CPC/73, art. 991, VII). Portanto, não pode o inventariante encerrar seu mister sem que antes apresente as contas de sua gestão. Com efeito, a atribuição do inventariante é exigência da norma, razão pela qual é obrigado a prestar contas e, por consectário lógico, o seu interesse de agir, para ajuizar a presente ação autônoma de prestação de contas, é presumido.
Não se pode olvidar que, apesar do Código de Processo prever que o incidente de prestação de contas do inventariante deve ser apresentado em apenso aos autos do inventário (CPC, art. 553), pode ocorrer a finalização do processo sucessório sem o acertamento das despesas. Além do mais, como se sabe, o inventariante pode vir, futuramente, a ser civilmente responsável pelos sonegados.
Desse modo, sobressai, nesses casos, o interesse de agir do inventariante na ação de prestação de contas pelo rito especial dos arts. 552 e 553 do CPC/2015 (e não do art. 550 do mesmo código).
Por fim, anote-se que, apesar de não ser um procedimento bifásico, a prestação de contas deve ter mantida o seu caráter dúplice, podendo haver débitos ou créditos a ser liquidados pela sentença.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi criado pela Constituição Federal de 1988 com a finalidade de preservar a uniformidade da interpretação das leis federais em todo o território brasileiro. Endereço: SAFS - Quadra 06 - Lote 01 - Trecho III. CEP 70095-900 | Brasília/DF. Telefone: (61) 3319-8000 | Fax: (61) 3319-8700. Home page: www.stj.jus.br
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 687 do STJ - 2021 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 mar 2021, 16:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Informativos dos Tribunais/56275/informativo-687-do-stj-2021. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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